Renovação das concessões

Aneel faz a opção pelo capital

Agência Reguladora aprova termo aditivo aos contratos de concessão de 19 distribuidoras que estariam a vencer entre 2025 e 2031

Escrito por Débora Piloni 27 de fevereiro de 2025
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Autor da foto: Reprodução

Em Reunião Pública e Ordinária realizada na última terça-feira (25), a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou o termo aditivo aos contratos de concessão do serviço público de distribuição.  No total, 19 distribuidoras possuem contratos a vencer entre os anos de 2025 e 2031. E, ao assinarem o termo aditivo, as distribuidoras de energia formalizarão a prorrogação por 30 anos do contrato de concessão, a partir do final da vigência do contrato atual.

E ao aprovar o termo aditivo ao contrato de concessão, a Aneel fez a opção pelo capital, não acatando em quase nada as considerações dos trabalhadores e nem da sociedade, uma afronta àqueles que mais precisam de um serviço público essencial que é a energia elétrica. Vale aqui lembrar que a Agência abriu consulta pública, em meados de outubro até o início de dezembro de 2024, ocasião em que o Sinergia CUT e a Confederação Nacional dos Urbanitários (CNU) enviaram suas contribuições.

Pois bem. No novo contrato, a Aneel assegura que as distribuidoras tratem a energia elétrica como commodities e um negócio rentista, em vez de tratá-la como um bem público para o desenvolvimento do país. Confira:

Muitas falhas no contrato

O termo aditivo aprovado pela Aneel não menciona a responsabilidade ou compromisso das empresas em relação à saúde e segurança dos trabalhadores e dos consumidores.

Também não explicita regras claras para as punições em caso de não cumprimento das metas de satisfação do cliente, ou seja, não traz efetivamente como as distribuidoras serão penalizadas, e em que condições, quando tais metas não forem atingidas.

O contrato aprovado não aborda a questão da acessibilidade para o consumidor, ou seja, não traz nenhuma obrigatoriedade sobre a reabertura de escritórios nas áreas de concessão, especialmente nas cidades de porte médio. Dessa forma, mantém as condições atuais, permitindo que as empresas prestadoras de serviço público continuem oferecendo um atendimento de baixa qualidade, sem melhorias no serviço, a exemplo da Enel e de outras.

O contrato não traz a necessidade da universalização da energia elétrica, apesar de ser um bem público essencial para o desenvolvimento e para combater a pobreza energética. Além disso, não estabelece nenhum critério que obrigue as empresas a adotarem políticas ambientais. Em um momento em que o país e o mundo enfrentam uma crise ambiental, com reflexos em crises climáticas, o novo contrato de concessão não impõe nenhuma obrigação às empresas para que adotem políticas alinhadas a esse contexto. Não há exigência de investimentos com a participação da sociedade ou de envolvimento das empresas com os órgãos governamentais que discutem essas questões.

O novo contrato não menciona em nenhum momento o compromisso da empresa com a transição energética justa. Em um contexto em que o mundo discute a transição energética, o contrato não impõe qualquer obrigação às concessionárias de energia para que assumam esse compromisso. Também não exige que elas abram um diálogo com a sociedade, o poder concedente e outras partes envolvidas na questão da transição energética justa.

O contrato não traz nenhuma inovação que estabeleça um compromisso real das empresas com a modicidade tarifária. Embora mencione a modicidade, não cria uma obrigação clara para que as empresas comprovem, de forma transparente para a sociedade, que estão adotando medidas efetivas para manter os preços acessíveis.

Além disso, o contrato não responsabiliza as empresas pela necessidade de manter um quadro de trabalhadores adequado. Atualmente, muitos dos problemas enfrentados pelos consumidores estão diretamente ligados ao baixo número de trabalhadores e falta de qualificação. E ainda dá  ampla liberdade para as empresas em relação aos negócios, investimentos, pessoal, materiais e tecnologias.

Curiosidades da reunião

Durante a votação do contrato de concessão, que, vale ressaltar, foi uma das reuniões mais longas da direção da Aneel, um dos diretores pediu vista do processo e apresentou uma proposta: as empresas multadas, caso queiram renovar suas concessões, não seriam obrigadas a pagar as multas existentes. Outro ponto curioso foi que um diretor, que estava de férias, compareceu à reunião exclusivamente para votar e acompanhou a decisão do pedido de vista.

Isso levanta uma questão importante: se, na visão desses diretores da Aneel, as empresas podem renovar suas concessões sem precisar quitar as multas aplicadas sob o contrato vigente, o que esperar, então, do novo contrato? O que a sociedade e os trabalhadores podem esperar de um contrato de concessão que permite esse tipo de tratamento?

Pontos da contribuição do Sinergia CUT e da CNU no novo contrato

De toda contribuição elaborada pelo Sinergia CUT e pela CNU enviada em dezembro à consulta pública da Aneel, alguns poucos pontos entraram no contrato, que foram:

  • Trabalho decente (tem o objetivo de garantir aos trabalhadores as condições de trabalho dignas, seguras e com direitos respeitados);
  • Para todo trabalho igual/salário igual, principalmente em atendimento ao que estabelece a legislação de igualdade salarial entre mulheres e homens;
  • Proibição de distribuição de dividendos (caso a empresa não cumpra determinadas metas, ela ficará proibida de distribuir dividendos entre seus acionistas);
  • A empresa se compromete a manter a qualificação dos trabalhadores;
  • A questão da proteção dos dados do consumidor, ou seja, a segurança das informações pessoais dos consumidores.

Luta que segue

Não é de agora que os representantes dos trabalhadores têm lutado para alterar  e melhorar os contratos de concessão. Há um histórico de articulações e contribuições que vêm acontecendo no decorrer de, pelo menos, dois anos, com reuniões no Ministério de Minas e Energia (MME), Tribunal de Contas da União (TCU), Casa Civil, Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com a direção da Aneel e com parlamentares. Tudo visando construir e esclarecer as reivindicações dos trabalhadores e da própria sociedade.

“Infelizmente, nossos pleitos vieram de forma muito singela para dentro do novo contrato e, ao contrário, as reivindicações das empresas entraram solidificadas. Novamente estaremos à mercê do descalabro”, lamentou Carlos Alberto Alves, presidente do Sinergia CUT.

E ele mesmo continua: “Mas, antes da assinatura do termo aditivo pelas empresas e pelo poder concedente, o Sindicato agendará reuniões com os órgãos cometentes na tentativa de aprimorar as demandas dos trabalhadores do setor. Não desistiremos dessa luta. Energia, serviço essencial!”, afirmou Carlos Alberto Alves, presidente do Sinergia CUT.

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